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quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Redistribuição Global

"A Oxfam defende a criação de uma taxa sobre transações financeiras internacionais", escreve o Sébastien Fourmy, diretor de políticas e campanhas da Oxfam na França, em artigo publicado no jornal O Globo, 21-10-2010.

Eis o artigo.

Diante das dramáticas consequências do aquecimento global ou, ainda, frente aos avanços que o desenvolvimento no mundo demanda, as necessidades de financiamento internacional são cada vez mais urgentes e relevantes.

A adaptação às mudanças climáticas e a diminuição das emissões de gases de efeito estufa requerem, somente nos países em desenvolvimento, investimentos anuais da ordem de 150 bilhões de dólares. Portanto, a ajuda pública ao desenvolvimento, realizada atualmente, está longe de ser suficiente para enfrentar essas mazelas. A solidariedade internacional precisa ser reinventada assim, como um novo entendimento sobre desenvolvimento deve ser construído entre as nações do mundo.

A Oxfam defende a criação de uma taxa sobre transações financeiras internacionais.

Tal mecanismo tem dois objetivos principais: em primeiro lugar, arrecadar quantias adicionais de recursos para combater os efeitos das mudanças climáticas, bem como para promover o desenvolvimento sustentável, especialmente para as populações mais pobres do planeta. E, em segundo lugar, contribuir para diminuir as atividades de especulação financeira que não têm qualquer serventia do ponto de vista social e que, em última instância, contribuem para desestabilizar a economia global.

Diuturnamente bilhões de dólares são movimentados nos mercados financeiros internacionais, cerca de vinte vezes o PIB mundial. Taxas muito pequenas, da ordem de 0,05%, no conjunto dessas operações poderiam gerar, no mínimo, 400 bilhões de dólares por ano. Essas atividades financeiras jamais teriam se desenvolvido e prosperado sem a globalização e, até hoje, permanecem protegidas de sistemas públicos de tributação. Ademais, em muitos casos, alimentam atividades especulativas que agravam as já precárias condições de vida das populações mais pobres, como no caso de ataques especulativos em torno de commodities alimentares, o que resulta no aumento internacional dos preços de alimentos e, consequentemente, na elevação da fome e da miséria.

Essa imensa riqueza somente beneficia os mais ricos, os únicos capazes de fugir da tributação, estimulados pela existência dos paraísos fiscais. Como consequência, a carga tributária passa, cada vez mais, a ser suportada pelas classes médias e pelas populações com rendimentos menores. O Brasil é emblemático nesse aspecto: dados oficiais revelam que os mais pobres pagam, em média, duas vezes mais impostos que os mais ricos. Essa injustiça tributária encontrada em inúmeros países se estende ao nível internacional. Daí a urgência de redistribuir essa riqueza criando um imposto de solidariedade internacional que possibilite financiar políticas públicas globais efetivas, implementadas no marco de instituições internacionais democratizadas e que visem a promover a universalização do acesso à saúde, à educação, à segurança alimentar e nutricional, à moradia adequada e ao trabalho decente; combater a pobreza e a injustiça social; desenvolver uma infraestrutura que possibilite o desenvolvimento de uma economia de baixo carbono.

O principal desafio da implementação de uma taxa desse tipo é que seja efetivamente aplicada ao universo financeiro internacional e à especulação, em particular, e que não acabe custeada pelo conjunto da população.

Não se trata de um tributo sobre as atividades bancárias tradicionais, mas de um tributo sobre os lucros oriundos das transações financeiras globais. Esse é o sentido da redistribuição e é isso que a França defende. Recentemente, em setembro, na Assembleia das Nações Unidas, os governos da França, do Japão e da Bélgica propuseram a criação de uma taxa sobre transações financeiras para o desenvolvimento.

Tal medida recebeu o apoio do poder público brasileiro.

O Brasil deveria investir todos seus esforços nos fóruns globais onde tem voz crescente (Nações Unidas, G20, G77, Ibas, Comitê de Segurança Alimentar), não somente para convencer os países relutantes a aprovar a proposta, como para assegurar-se que essa será implementada buscando a efetiva redistribuição global dos recursos, pautada pelo princípio da solidariedade internacional.

Tudo está por construir e o Brasil tem uma responsabilidade histórica na defesa dos bens públicos globais.

A Cúpula do G20, em 2011 na França, será o momento apropriado para avançar na construção de políticas públicas globais efetivamente redistributivas.

Já está mais do que na hora de a economia globalizada contribuir para a solidariedade internacional.

Fonte:http://www.ihu.unisinos.br/